terça-feira, 6 de março de 2007

Antes João Hélio, agora Alana.

Texto retirado do Blog do Reinaldo Azevedo - http://veja.abril.com.br/blogs/reinaldo/
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Depois de tudo que já soltei aqui, esse texto reforça o que deveria ser a nossa indignação. Como diz o Reinaldo, volto depois do texto.


O Brasil é um açougue. Quem chora por Alana?

Acima (no post anterior), o quadro Açougue, de Pieter Aertsen (1551). Aqui nesse post, primeira página de hoje da Folha.
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Retrato triste e revoltante estampado na primeira página da Folha de hoje: Edna Ezequiel chora a morte de Alana Ezequiel, 12 anos, sua filha, atingida por uma bala perdida no confronto entre traficantes e a polícia no Morro dos Macacos, em Vila Isabel, no Rio. Edna traz no pulso o que poderia ser uma profissão de fé, uma aposta, uma crença no futuro: uma pulseirinha com a bandeira do Brasil. Todos os adornos do braço remetem às cores pátrias. Edna traz no pulso um certificado. Não há dúvida de que sua filha morreu no Brasil. O Brasil que você traz no braço, Edna, matou sua filha. Sua pulseira não é um adorno, é um grilhão. “Os grilhões que nos forjavam/ da perfídia astuto ardil...”
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Revoltamo-nos com absoluta justiça quando uma criança, como João Hélio, é morta, arrastada como foi, descarnada, vituperada, despida de sua pele como quem é expropriado de sua humanidade. Que diabo está acontecendo conosco? Precisamos pendurar o Homem (vai aqui com “h” maiúsculo) nos ganchos do açougue de Pieter Aertsen para nos comover? Já não nos basta mais a morte, tão nossa íntima, tão próxima de nós, tão corriqueira, tão banal. E, sim, é verdade: aquele país da pulseirinha embandeirada se mobiliza menos quando morre um preto pobre do que quando morre um branco de classe média. A esquerda vive gritando isso por aí. Ocorre que ela não quer proteger os negros. Ela os quer como bandeira política. O país que mata a filha de Edna tem cotas em universidades. Os pretos de tão pobre e pobres de tão pretos servem ao proselitismo político; são só um pretexto.
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Desde o episódio de João Hélio, o que mesmo se fez para combater a violência e diminuir a impunidade? Márcio Thomaz Bastos meteu o nariz (enorme!) no debate apenas para pedir calma: diz ele que não quer uma legislação do pânico. Lula acusou a falta de crescimento econômico dos governos passados. Na sua mente perturbada, os pobres apenas matam. Não, senhor: os pobres e pretos, como Alana Ezequiel, 12 anos, morrem. Morrem em número infinitamente maior do que os brancos de classe média: são reféns do tráfico, foram seqüestrados pela bandidagem, estão sendo chantageados por milícias, foram pendurados nos ganchos pela falta de Estado.
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Edna não aparece na televisão. Alana não aparece na televisão. Quando um negro aparece na televisão, ele já foi “embranquecido” pela ideologia da contestação. Gostamos é de um certo MV Bill, a que assisti outro dia numa palestra para alunos da Universidade de Brasília, transmitida pela TV Câmara. Disse o homem que era contra o tráfico, mas não contra o traficante. MV Bill... O nosso Santo Agostinho: contra o pecado, mas não contra o pecador.
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A bala que matou Alana também é a bala da demagogia, da má consciência.
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Boas questões colocadas por Reinaldo em seu texto, justo ele que é tão acusado de reacionário, "direitão", fascista e outros apodos gentis que lhe pespegam os do outro lado. Ele não poupa a esquerda, e por isso às vezes exagera em seus comentários, mas não se pode negar que sua crítica é pontual e precisa. Afinal de contas, o que aconteceu desde a morte de João Hélio?? Alguém responda isso, por favor!
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Um comentário:

Bosco Carvalho disse...

Eu e você somos os assassinos.
Eu e você reprimimos nossa agressividade de tal forma que ela sai por aí, pelas mãos de outros, matando.
Eu e você somos bonzinhos, quase santos. Sorrimos, quando deveríamos abrir a boca e dizer não.
Acusamos quem tem idéias claras e defende ideais de 'radical'.
Nem sabemos que 'radical' significa RAIZ.
Eu e você somos ignorantes de nós mesmos.
Eu e você queremos levar vantagem em tudo.
Eu e você ficamos felizes quando 'não foi um de nós' que matou, trucidou, esfaqueou, esmurrou, baleou, esganou uma outra pessoa.
Eu e você adoramos reprimir. Reprimimos nossa violência, nossos instintos, nossa animalidade.
Aprendemos um monte de teorias nas universidades, quando aprendemos... e só usamos o aprendido em nosso próprio benefício.
Eu e você matamos, quando nos escondemos por detrás de nossa máscara de civilidade e permitimos que 1% da população sejam proprietários de 50% das terras deste país.
Eu e você matamos, quando sabemos que expressar agressão nos dá saúde mental e não o fazemos.
Eu e você assassinamos, quando ficamos indiferentes ao que acontece a nosso redor.
Eu e você somos covardes quando votamos em políticos corruptos e nada fazemos para retirá-los do poder.
Eu e você somos coniventes do crime, quando pagamos os juros mais altos do mundo aos bancos.

Entendam um pouco mais a respeito da violência aqui: http://zecabatuta.blogspot.com/2007/02/por-que-gritamos.html