sábado, 24 de fevereiro de 2007

E o carnaval aconteceu...

E o carnaval aconteceu...
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Ainda não formei opinião se o carnaval nos serve de escapismo físico ou se realmente não damos a mínima pra nada e o carnaval é somente o sintoma disso. O mais recente. Outros existem aos montes, BBB´s, novelas, futilidades aos montes que nos são servidas em doses generosas.
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Fiquei sem escrever aqui no blog um tempo, porque não consigo escrever sobre nada mais que a violência, João Hélio e coisas afins a esse tema. Acompanhei algumas discussões orkutianas, alguns comentários aqui no blog, muitas conversas ao vivo e à cores com amigos e conhecidos, e realmente ainda não consegui superar o tema. Não que esteja chocado ou aterrorizado ou qualquer outro estado emocional exagerado como esse, mas é que não consigo pensar em nada mais que valha a pena ser escrito aqui que não seja meu estupor com a vida que vivemos.
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O Pão comentou um dos textos abaixo dizendo-o superficial. Não me incomodei nem achei ruim primeiro porque respeito muito a opinião do Pão, que é um dos guris que conheço que pensam de forma crítica, mas principalmente não me incomodei porque não tive a pretensão de ser profundo. Nunca consegui ser profundo em nada, não iria conseguir agora, movido pela emoção como estava.
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Superficial como um pires, mas sincero, isso me resguardo. Fiquei preocupado de parecer que eu também estava aproveitando a celeuma, o tema quente para aparecer ou simplesmente cativar meus minutos de destaque, coisas que realmente não aconteceram. Não sou nenhum Datena que urra nos monitores pedindo closes e reclamando providências, enquanto seus patrocinadores vinculam comerciais engraçadinhos e ele mesmo – gordo e bem penteado – apresenta produtos em seu programa. Entre cada “Isso é um absurdo” sempre pode-se encaixar um “em 12 vezes sem entrada”, como sempre vemos cotidanamente. Não estou vendendo nada, não ganho nada com isso, só grito o que sinto e penso, superficial, tolo ou não. É meu.
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E o blog é realmente a máxima experiência democrática – ou anarquista, como queiram – porque nenhum dos viventes que vêm por aqui tem a obrigação contratual de visitar esse endereço. Visitam por querer, e continuam aqui lendo as letras por também quererem, então os meus poucos minutos de sofrimento pela comparação com Datenas da vida logo soçobrou sossegadamente. Não quero aparecer. Não vendo nada. Só falo.
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Muito vem sendo dito sobre maioridade penal e coisas assim, mas acredito eu que nesse momento já ficou claro até para o maior dos bestuntos que a questão principal não é diminuir a idade para prisões e condenações, mas fazer com que as prisões e condenações sejam cumpridas de forma correta, justa e conforme foi prescrito em julgamentos e pareceres legais. Como visto num post aqui abaixo os criminosos que chacinaram João Hélio poderiam estar fora de circulação, ao menos um deles, poderia estar cumprindo sua pena recluso e separado dos presos-do-lado-de-cá. Mas estava solto, livre, muito mais que todos nós, que vivemos presos em nossa vida civil, entre muros elevadíssimos, entre cercas elétricas, vidros blindados com insulfilme nos carros, evitando passar em caixas 24 horas depois que escurece, procurando bares com estacionamentos próprios, e seguindo uma infinidade de rotinas absurdas para nos proteger. Nós, que estamos livres, que não descumprimos nenhuma lei, ou que ao menos nunca fomos condenados, estamos tão ou mais presos que os encarcerados.
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Nem o telefone nos permite conforto, porque esse também já é uma ferramenta do crime organizado (muito mais organizado que a lei, dirão muitos), que nos liga dando detalhes de nossas vidas ou ameaçando gente que não está ao nosso lado. Reféns. Viramos reféns. E a tudo isso aceitamos com esquizóide normalidade. E vamos ao carnaval, pois nossa fantasia de um mundo alegre precisa desses espasmos de prazer, intervalados que são pelas tragédias e notícias escabrosas.
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E em meio a tudo isso vemos pessoas falando em “ressocialização dos criminosos”, reclamando que os presídios não servem para ressocializar os criminosos. Fico pensando, alguém se preocupou em perguntar aos encarcerados se eles querem se ressocializar? Alguém perguntou a um traficante se ele deseja se integrar à sociedade de consumo, ser um digno trabalhador sem escolaridade ganhando R$ 350,00 ao mês? Alguém realmente acredita – suprema inocência – que um sujeito que ganha milhares de reais por semana, vive como um nababo em sua comunidade aterrorizada, vai querer ser um trabalhador de carteira assinada? Se alguém acredita nisso, pordeusdocéu, tentem me convencer, porque me tornei um cético total nesse item.
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Sim, existem criminosos que merecem uma segunda chance. Existem criminosos de ocasião, gente que falhou e se entregou a uma oportunidade que parecia boa, mesmo sabendo do erro do ato e das conseqüências do mesmo. Existem ainda criminosos de necessidade, gente que não viu outra escolha que não roubar para alimentar a si ou aos seus. A todos esses eu acredito que a reclusão, a condenação é pena suficiente para ressocializar (esse verbo é tão estranho que o word não o reconhece) e para permitir que voltem ao convívio da comunidade sabendo o preço de seus atos.
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Mas existem os que não tem possibilidade de volta a nada de civilizado, tornaram-se bestas-feras, criaturas sem limites, nem ouso chama-los animais pois animais não merecem essa comparação. Não me digam que um Marcola, Fernandinho Beira Mar e gente como eles tem alguma possibilidade de voltar a ser um “cidadão de bem” (defina isso como quiser). Não me diga que um sujeito desses tem interesse em deixar o poder, a glória, a grana, o sexo, a droga, tudo que vem junto com sua posição de capo criminoso. Para gente assim a prisão não é para ressocialização, mas para punição. É castigo, punição, para separar “eles” de “nós”, para tirar de circulação e quanto mais tempo melhor. Não vão mudar, não querem mudar, não ligam para mudança, querem apenas seguir sua trilha já escolhida e que lhes dá a satisfação desejada.
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Não sou advogado, entendo pouco de leis, mas tenho a firme convicção de que em casos como os citados a prisão não deveria ter forma nenhuma de “aproveitamento de tempo”, mas somente tempo ocioso, segregado, isolado, proscrito e nesses casos alguns até poderiam questionar sua atitude, outros enlouqueceriam, mas nenhum deles estaria aqui fora ameaçando aqueles que amo.
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Espero que ninguém pense que concordo ou defendo a pena de morte, não é esse o caso. Tirar a vida de alguém é medida de brutalidade, independente de quem o comete e de como é cometido, se na correria de um assalto ou na assepsia de uma cela de execução. Matar nunca é a solução.
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Alguém disse certa vez que a sociedade só deveria ter o direito de matar um criminoso se não tivesse nenhuma responsabilidade na gênese e criação desse mesmo criminoso. Concordo, mas não totalmente. Eu procuro fazer o que me dizem ser certo, eu procuro ser correto, procuro seguir princípios éticos, procuro até ser educado em questões comezinhas do dia-a-dia como cumprimentar as pessoas ou ceder a vez na fila para grávidas ou idosos. Não quero aceitar calado a culpa de criar monstros. Goya pintou o quadro que ilustra esse post, que se chama “O sono da razão produz monstros”. Claríssimo. Quando a razão falha, monstros surgem se aproveitando das brechas, das fendas, dos cantos com sombras, e isso vem faltando em nossa vida diária, razão e cuidado. Por isso acho que executar aqueles que saíram do caminho escolhido pela maioria não seria a solução, mas não me oponho à prisão perpétua.
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Que se prendam para sempre os monstros. Sei que esbarramos em situações como um sistema jurídico cheio de oportunidades cínicas, pessoas que deveriam ser éticos e corretos mas que se aproveitam de sua posição para ganhos pessoais e todas essas situações que deixam mais problemas no caminho de todas as soluções propostas.
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Pelo menos se conseguíssemos ver indignação, ver gente se movendo em busca de resposta, gente que não aceita calado o que vêm acontecendo todos os dias nas nossas portas, nos nossos olhos, teríamos algum vislumbre de mudança. Mas o que vemos são alegorias e mestre-salas, baterias e porta-bandeiras.
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Nosso carnaval continua.
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Até quando?
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Eduardo Mesquita, O Inimigo do rei
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2 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom texto. Concordo com suas idéias " superficiais". Isso porque vc ainda se esqueceu da absurda liberação de presos em datas especiais em que muitos deles não retornam à prisão e ainda cometem crimes como o assassinato de uma jovem em São Paulo no último Natal. Abraços.

Eduardo Mesquita disse...

Exatamente Frederico, muitas dessas saídas resultam em fugas, crimes e isso tudo porque são concedidas sem critérios e de forma descuidada. Além de uma fiscalização e controle ridículos e mal feitos. Problemas são muitos, não sei se apontá-los ajuda a resolver, mas vamos tentando.

E assim eu inauguro uma nova atividade, vou buscar responder os comentários que forem feitos aqui no Blog. Sempre achei que deveria, mas não queria invadir o espaço de quem lê, mas considero que responder aqui seja uma questão de educação, principalmente. Agora eu vou responder.

Há braços!