quarta-feira, 29 de março de 2006

"Eu sabia que eu ia brilhar!"

Uma vez eu vi uma pichação num muro daqui de GoiâniaTown que dizia mais ou menos o seguinte:
"Eu sabia que eu ia brilhar! disse o fogo de artifício, e se apagou"
Lembrança essa que me remete à Dédalo e seu filho com complexo de mariposa – foi atrás da luz e se deu mal. Tudo isso para apontar o rumo da conversa para o lado dessa coisa sedutora, mas perigosa, o brilho. E conseqüentemente alguns corpos que emitem brilho, as estrelas.

A idéia original desse texto é do Nettü Regert, diretor da Associação Pró Rock de Vilhena – RO e baixista da banda Enmou, e surgiu numa prosa eme-esse-ênica dia desses, em que ele comentava sobre o tanto de gente que quer ser estrela na cena rock independente. E nem discutíamos a exclusividade dessa cena para criar figuras desse tipo, porque sabemos mui bien que gente assim existe em todos os ambientes e grupos possíveis. Mas é que escolhemos fazer alguma coisa no meio desse povo nosso aqui, e gente que sobe em gilette pra fazer discurso realmente enche o saco.Porque estrela é um corpo celeste que possui luz graças aos fenômenos e reações termonucleares que ocorrem dentro dela, ou seja, o corpo celeste produz a própria luz, às custas do próprio esforço, consumindo-se para realizar esse intento. Não é como uma Lua qualquer que simplesmente reflete a luz dos outros, e já adianto que não vou mergulhar profundamente em questões astronômicas porque posso levar bronca de gente mui próxima na eventualidade de cometer alguma barbaridade aqui. Teremos, portanto, somente o suficiente para alimentar a fogueira.
Porque, se nos basearmos no parágrafo anterior e fizermos uma avaliação das pessoas que compõem os eventos e ambientes do rock independente, veremos que muitos ainda se envolvem com o rock na busca de reconhecimento, destaque e as coisas que usualmente (utopicamente, convenhamos) acompanham, ou seja, sexo, dinheiro, sucesso e afins.Bão... começando de trás para frente, sabemos muito bem que o rock independente não se presta tão rapidamente a oferecer-nos sexo, sucesso, fama, dinheiro e fortuna (sim, dinheiro é uma coisa, fortuna é muita coisa). O rock independente nos oferece antes a possibilidade de muita ralação, muito esforço e conquistas gradativas e muitas vezes, pequenas, e isso tudo quando contamos com o apoio de muitos pelo país inteiro (leia-se Fora do Eixo e Abrafin, por exemplo). Então quem entra nessa para "se dar bem" pode se frustrar rapidamente, e perder o ritmo.
Agora quem entra querendo ser destaque, ou se falarmos de forma direta, quem entra nessa "querendo aparecer", esses já possuem melhores condições de satisfação, porque nos shows, festivais e bares onde o povo rock se encontra, muitas são as oportunidades de ser reconhecido pela galera do rock, de ouvir comentários da galera do rock, de ser elogiado pela galera do rock, e por aí vai. Ou seja, existe a possibilidade de "aparecer", mas para um público restrito e seleto, e esse aparecer também é bastante relativo.
Digo isso porque nas vezes em que dirigi peças de teatro, sempre deixava claro para o elenco que quem faz teatro, mais que querer se expressar, viver a arte, exercer a sensibilidade, a pessoa que faz teatro quer aparecer. E como pendurar melancia no pescoço pode dar problema de coluna, muitos escolhem subir num palco e se destacar da multidão. E não há mal nenhum em querer se destacar da multidão, querer aparecer ou coisa semelhante, porque é um desejo legítimo e digno como qualquer outro, e que bom que existe o palco para oferecer esse destaque. Lamento mais pelos que se contentam em ficar eternamente na platéia, em meio à multidão, sem correr risco, sem ousar e sem criar.
Mas o problema é que muitas vezes os ansiosos por brilho querem muito e muito rápido, e ignoram o risco de se extinguir na metade do tempo, como aquela expressão que diz que a lâmpada que brilha duas vezes mais forte se extingue duas vezes mais rápido, ou seja, na metade do tempo. Me lembro de um show que fui no Martim "Serelepe" (esse termo é criação do Fernando Pudim. Gostei, CTRL-C, CTRL-V) de umas bandas iniciantes num fim de semana sem rumo na cidade. Eram bandas que estavam fazendo o primeiro show, a maioria com uma garotada ainda sem idade para tirar carteira de motorista, e um dos shows de uma das bandas (que eu realmente não lembro o nome) tornou-se inesquecível. O vocalista da banda era um cara cheio de pose, com óculos escuros, cabelo loiro desgrenhado, camisa aberta no peito magro, olhar blasé, empunhando sua guitarra de forma relaxada, bem rockstar mesmo; e no meio do show ele comete essa: "Minha cerveja acabou, providenciem outra", como se fosse o próprio Bono. A platéia, quase toda composta de amigos e parentes, ficou num estado de "Ãn?" que seria engraçado se não fosse tão constrangedor.
E o loirinho ficou lá, com a lata vazia na mão, olhando em volta e esperando os roadies (que não existiam) ou as groupies (que também não existiam) ou o produtor da banda (que... bom, já sabe, né?) trazer a cerveja pra ele. Tá loki?
Sim, subir num palco, fazer um programa de rádio virtual, montar um selo, escrever para sites, tudo isso dá destaque sim, porque você tá mostrando sua cara e suas idéias e arcando com o preço disso, mas daí a ter brilho, reconhecimento, aí já vão outros quinhentos kilômetros. E essa distância se compõe de coisas como qualidade, oportunidade, coerência, adequação, dedicação, esforço, suor e um monte de outros detalhes que fazem toda a diferença, principalmente quando falamos de bandas numa cidade como GoiâniaTown que tem mais roqueiro que gente. Alguns dias, em finais de semana, temos dois eventos acontecendo, com quatro ou até mais bandas em cada um, então para se destacar nessa multidão de bandas, tem que ser muito boa. Do mesmo jeito para ser destaque como produtor de shows, como dono de selo num cenário nacional como o atual, em que tem tanta gente boa ralando bastante, tem que ter serviço prestado, tem que ter suor na engrenagem, não basta querer ser bom, tem que mostrar o resultado.
Mas infelizmente tá cheio de gente que acha que antes da responsabilidade de assumir o que se fez, vai surgir o reconhecimento pelo esforço empreendido (que nem sempre é tanto esforço assim, sejamos sinceros) e os louros (ou as louras) da vitória lhe serão gentilmente oferecidos. Tá viajando! Primeiro porque até ser reconhecido como uma estrela, com brilho próprio, consumindo o próprio hélio ou hidrogênio, tem muito pasto pra ser digerido, tem muito suor e esforço. Vai tomar pedrada, vai ouvir o que não quer, vai ser mal interpretado, vai ser cobrado em atitudes que não quer ter, vai ter que assumir compromissos chatos e muitas vezes burocráticos, enfim, não é só alegria.
Quantas vezes a vontade é dizer "Mermão, baixa a bola!" para gente que tá inchado sem necessidade, mas eu ainda acredito que não posso dizer tudo que penso. Nem sempre convém, e se eu fosse lá dizer para o loirinho da cerveja acabada que ele tinha que baixar a bola, ele ia me olhar com cara de "Te conheço?" e meu comentário não ia adiantar nada. Aí o metido, posudo, seria eu, achando que minha opinião tem importância pra alguém.
Acredito muito mais em constante questionamento e reflexão, mas isso pode ser coisa de quem tem mais de trinta e que já quebrou a cara uma porrada de vezes suficientes para duvidar quando as coisas parecem ir bem demais. Por isso sou chamado e acusado de ser marketeiro, mas realmente eu vejo minhas atividades de forma marketeira (pronto, assumi! rs) e com base nisso sempre querendo melhorar, de acordo com o que quero expressar e de acordo com o meu público alvo. Assim não fico acomodado achando que não existem mais maneiras de melhorar (e sei que existem milhões delas), sentado num trono fictício, me deliciando com uma vitória que ainda não conquistei. Quer prova disso? A ausência nesse texto de um tema que sempre abordo, mas que alguns leitores estavam sentindo que era incômodo, desnecessário e forçado. Ouvi, digeri (não é fácil, mas eu tento), refleti e vi que realmente não tinha necessidade de ficar sempre batendo na mesma tecla. Sei que preciso melhorar demaaaaaaaaaais em um monte de coisas, e não posso negar fontes preciosas de informação na hora de avaliar meu desempenho.
"Sucesso" só vem antes de "Trabalho" no dicionário, e mesmo sendo uma expressão velhusca, é verdadeira ao extremo. Então quem quer destacar, bota a cara na janela e grita, já consegue.
Agora quem quer brilhar, começa a ralar bastante, porque aí o caminho é mais difícil, e porque estrela cadente brilha, mas não possui luz própria, é só um pedaço sólido de algo pegando fogo por causa do atrito com a atmosfera; e para pegar fogo no espaço não é necessário muito esforço, basta cair bem rápido.
Nettü, valeu pelo argumento!
Eduardo, O Inimigo do rei - eduardoinimigo@gmail.com

Nouvelle Cuisine ou Pastel de feira?

Comer!

Tive uma namorada na época de faculdade que dizia que "melhor que comer, só ser comida", o que não deixava dúvidas sobre seu prazer tanto com o sexo, quanto com os prazeres da mesa. Comer realmente é uma experiência que merece tempo, dedicação e que sempre se define por escolhas, hábitos, prazeres, costumes, e muito de tudo isso por experimentações. Até porque "a fome é humilhante", já disse o poeta. Mas se formos avançar no tema da comida, vamos ver que esses hábitos e prazeres por vezes colocam pessoas em flancos distintos. Não que precise ser assim.
A cozinha francesa, por exemplo, que na década de 70 gerou a "nouvelle cuisine" como contraponto aos banquetes e cardápios intermináveis, pantagruélicos e exagerados.. Esse movimento, com seus defensores apaixonados, durou por uma década aproximadamente, quando no final dos anos 80 a cozinha francesa buscou um retorno às tradições, sem, no entanto, renunciar a alguns detalhes pertencentes a nouvelle cuisine. Facções diferentes que aprenderam uma com a outra. Integração.Em outro extremo temos o pastel, um lanche tipicamente brasileiro, que tem sua origem no "rolinho primavera" da culinária chinesa. Cabe comentar que o surgimento do pastel se deve aos imigrantes que precisavam se adaptar ao que existia de matéria prima no Brasil, e sua popularização se deve aos japoneses que aqui chegaram depois da Segunda Guerra Mundial. Precisando se passar por chineses, para driblar o preconceito e a discriminação, os japoneses em sua maioria foram responsáveis pelo surgimento de inúmeras pastelarias nas cidades onde aportaram. Daí para ocupar as pontas saborosas das feiras, foi um pulo.
Conheço pouco de cozinha francesa, e o que conheço se deve às artes e talentos do Luciano Bocão (batera do SANGUE SECO, chef e refinado enófilo também), que já me honrou com convites para várias degustações marcantes. Em especial me lembro de um Miolo de Alcatra com Ervas e Cogumelos, feito na casa das irmãs Camila e Aline para receber inimigos de outros estados, que por muito pouco me mata de gula. Mas certamente conheço com maior familiaridade as maravilhas de um pastel quente, sequinho e bem recheado, e guardo boas lembranças de tantas vezes que eu e Maurício Mota (vocal do HTS) pulamos o muro do Colégio Ateneu para comer pastel na feira logo pela manhã, com um farto copo de caldo de cana na banca da japonesa. Sem falar nas madrugadas terminadas ao redor do pastel inesquecível do Bar do Kuka, do tamanho de um travesseiro e regiamente recheado.Isso tudo dito por que se existem públicos para tipos tão distintos de comida, acredito piamente que existem públicos para todos os tipos de eventos que surgem em qualquer cidade. Gente que quer um evento sem filas, com lugar para sentar, temperatura adequada e som de qualidade; e gente que quer um evento sem nenhuma preocupação com o ambiente, porque o que interessa é a dedicação, a entrega, a ideologia e o som cru, sujo e na estratosfera, por exemplo. Já falei isso em outros momentos, mas acredito que muitas vezes ainda vemos equívocos por justamente se acreditar que alguém que goste do prato francês não vai gostar do pastelzão de carne apimentado. Mas se o grande contribuinte do processo de crescimento é justamente o contato entre situações aparentemente contraditórias e antagônicas! Se é justamente quando nos confrontamos com o novo que podemos perceber oportunidades novas, novas situações, sabores, amores, quereres e gostares, porque proibir-se de conhecer algo ainda alheio à sua realidade?
Na cena rock independente de GoiâniaTown eu sou um novato, ou um "new generation" como vi esses dias num site, isso porque nos anos que a cena rock floresceu eu estava me casando, trabalhando feito um loki, envolvido com outro mundo. Quando me envolvi com o rock, muito pelo viés do meu trabalho, e também pelo sonho de viver do e no rock independente, comecei a procurar pelas oportunidades de renda e lucratividade nos eventos do rock, e até por essa empolgação incorri no erro ingênuo de transparecer (passar uma imagem equivocada) que priorizava ou valorizava um lado da cena e denegria e desrespeitava o outro. Como se somente o Miolo de Alcatra pudesse me alimentar, e o pastel não me fizesse feliz e satisfeito. Quem viu isso, viu errado, ou quis ver errado.
Quando eu freqüentava o rock na cidade, muito tempo antes do Cantoria, muitos aqui ainda viviam longe de GoiâniaTown ou ainda usavam calções com personagens da Disney. Sou do tempo de ver Choque Cultural tocando na Praça Tamandaré, eu vi o Frenesi Precoce (que digievoluiu para o The Not Yet Famous Blues Band) tocando em "bar de burguês", assisti show do Quarto Mundo no Clube Itanhangá com as famílias sentadas na grama fazendo piquenique, briguei para conseguir K7 pirata do 17º Sexo do finado Mário Martins, e estava no Teatro Goiânia quando o Restos da Cultura Proibida tocou e no meio do show a máquina de fumaça pegou fogo e o Lenine urinou em cima, para apagar as chamas. Eu sou desse tempo, como disse o cabeleira (ou trepadeira, quaresmeira, sei lá) sou um "Velho", e nessas priscas eras não havia isso de "esse tipo de show" e "aquele tipo de show". Eram poucas as oportunidades de se ver uma banda tocando, então sempre que havia era uma oportunidade imperdível, e todo mundo se conhecia e todo mundo ia no show de todas as bandas. Eu posso estar romantizando minhas lembranças, mas é assim que eu me lembro.Semana passada eu fui a um show no CapimPub, do Afonsim (que era vocalista do Restos da Cultura Proibida), tido e reconhecido e valorizado como um lugar tosco e de shows toscos. Fantástico. Além das bandas que tocaram (Kundaline, Against, Ímpeto), aquele tanto de gente legal, conhecida, positiva, compõe a festa, faz a noite valer a pena. Isso porque valorizar esse ou aquele evento é só uma questão do foco que dirigimos nossa atenção, ou como diria a Gestalt-terapia, uma questão de "figura/fundo".
A tosquice de um show desses é só no ambiente, ou seja, no exterior, na aparência. A garra e dedicação dos caras, a felicidade de estar junto de gente boa, a alegria de estar ali fazendo o seu som sem pretensão nenhuma, só alegria e tesão, tudo isso é o que compõe o evento tosco. Tem público para ele? Aos montes! Domingo é dia de CapimRock, e sempre tem público, mas existe ainda desinformação e preconceito. E convencionou-se acreditar que o preconceito existe por parte daqueles que acham que o evento tosco é porcaria, e por isso não vão, não apóiam e se limitam a falar mal. Mas surpreendentemente existe muito preconceito de muitos que são do ambiente, porque vêem o evento como algo para "iniciados", e aqueles que não são "das antigas" são tratados como estranhos no ninho, com reserva, cautela e até distância. Nesse ponto um evento maior e um evento tosco são idênticos, porque quem não é da turma, fica de lado, no canto, sem espaço. Claro que isso não é comportamento padrão, mas de alguns destacados tacanhos que freqüentam e que existem em todas as tribos, que buscam preservar seus grupos porque tem medo do novo.A grande maioria das pessoas envolvidas em rock independente ainda possui, felizmente, a coisa adolescida de querer contato, conversar, trocar idéias, rir junto, e isso faz os eventos, shows e festivais uma celebração muitas vezes maior do lado de fora dos portões do que dentro dos shows.
Por isso não existe o dilema entre o roquefort e o pastel de pequi (se bem que eu detesto pequi), porque existem públicos para todos os eventos. Se a questão principal é o foco dirigido ao evento podemos perceber que os shows toscos querem diversão, integração, uma ideologia que valoriza o ser humano acima de qualquer coisa. Os eventos maiores visam além ou acima disso tudo a remuneração dos envolvidos, lucratividade, contas pagas e profissionalismo.. Não são antagônicos, mas complementares.
Como exemplo, vamos usar alguns itens de "Os dez mandamentos da nouvelle cuisine", elaborados em 1973 por Henri Gault e Christian Millau, e aplicá-los aos eventos rock independente.
1. Não cozerás demais – muitas vezes manter cru, direto, básico é o que basta para garantir a integridade.
2. Utilizarás produtos de qualidade – isso sempre, porque para o público que quer a banda barulhenta e destruidora tragam o HC-137, para os que querem técnica e poder de fogo usem o Macaco Bong, para quem quer alegria e dançar até cair coloquem o Shakemakers! Adequem-se ao seu público!
3. Não serás sistematicamente modernista – inventar moda por inventar moda não se justifica. O simples é o mais certo, então "algumas tradições precisam ser mantidas" (Manifesto Antropofágico da Semana da Arte Moderna).
4. Não usarás truques para melhorar tuas apresentações – seja verdadeiro com o que você pretende. Se pretende ganhar dinheiro, não existe motivo para sentir-se embaraçado com isso, afinal de contas as contas não deixam de chegar.
5. Serás inventivo – criativo para buscar parcerias, novas formas de satisfazer seu público, maneiras de trazer bandas de cada vez mais longe, multiplicar seu nome e credibilidade por todos os cantos.
Se temos o interesse de que o rock perdure e tenha longevidade nas nossas cidades, precisamos parar de picuinhas entre grupos e igrejas dentro da cena rock, e ao invés disso buscar formas de fortalecer ainda mais o movimento, buscando novos públicos, reforçando a imagem de eventos seguros e divertidos, desenvolvendo uma imagem forte.
Sexta feira, dia 10, conversava com o Léo Bigode no lançamento do CD do Rockefellers justamente sobre a necessidade de se levar o rock para as escolas, para o interior dos estados, realizar oficinas de formação de produtores de shows, oficinas de fanzines, porque existe uma multidão de adultos, jovens, adolescentes e pré-adolescentes que não sabem que existe rock independente, e que iam adorar saber isso. E passariam a freqüentar, montar bandas, criar fanzines, fazer shows, e o tsunami não pára!
No fim de tudo uma coisa tenho certeza, domingo 19 de março eu vou ao CapimPub, tem show do Sangue Seco, Rótula e Explícitos, com catuaba no palco e muitos amigos na platéia.
É dia de pastelzão quente e cheio!! E tá todo mundo convidado.
Eduardo, O Inimigo do rei - eduardoinimigo@gmail.com

Então eu não posso dizer que isso é uma merda??

Quem quer ser crítico? Não digo ser uma pessoa que tenha senso crítico, mas minha pergunta se refere a comentar shows e discos, tecer esses comentários que geram tanta confusão ou incenso, dependendo do lado que se atira.

Quem quer ser? Eu até gostaria, mas não posso, não tenho informação suficiente, mas tenho menos discernimento ainda. Isso porque acho que gosto de tudo, de forma meio esquizóide. Prefiro rock pesado, mais especificamente ainda punk rock, do tradicional, que ouvíamos nos anos 80 enquanto dançávamos na rua com a cara cheia de vinho barato. Não sou o primeiro a dizer que as opções e vivências da adolescência são marcantes e definitivas para uma vida inteira, nem acho que sou o segundo a dizer isso, mas definitivamente sou uma prova viva. Mas eu estava falando de gostar de punk rock, e acrescento que isso não me impede de gostar muito do som MPBístico "da floresta" do Los Porongas, do instrumental hendrixiano do Macaco Bong, do som inglês do Violins e da brutalidade eficaz do Ressonância Mórfica. E posso até estar ofendendo alguém com esses rótulos que usei, porque realmente não tenho muita noção.Esse é um ponto forte do problema: a minha inépcia em avaliar um show, ou um disco ou uma banda de forma crítica. Porque para ser honesto, eu sou raso demais para dizer qualquer coisa além de "gostei" ou "não gostei". E isso realmente não me autoriza o papel de crítico. Seria muito fácil para qualquer um dinamitar um crítico desses.
Por exemplo, se eu digo que "não gosto de Picolé de Nervo", alguém pode me perguntar porquê, e eu não ia conseguir desatar esse nó.Isso porque o crítico, de onde eu vejo, tem que possuir algo além do conhecimento vasto em música e assuntos congêneres. Fazendo uma apropriação não literal do que diz o "personagem" Lester Bangs em "Quase Famosos" ("Almost Famous" de Cameron Crowe), o crítico precisa ser impiedoso, e isso não é algo distribuído em cestos de brindes no fim do ano. Muitos até são impiedosos o suficiente para dizer "gostei" ou "não gostei" numa conversa de bar, comentando o show, mas o crítico coloca a cara na janela e grita isso para todo mundo saber quem disse. Tem que ter cojones, tem que se responsabilizar.
Responsabilidade. Essa palavra é muito importante para todo aquele que ousa se tornar crítico, porque tudo que ele disser será documentado e registrado como a opinião dele, e isso vai balizar todos os leitores dali em diante. "Lembra o que ele disse do cd do Allface?", e para sempre isso será a base em que muitos leitores vão se apoiar para decidir ler ou não mais um artigo publicado.Responsabilidade. Porque na situação de um crítico que conta com credibilidade, uma opinião desfavorável irresponsavelmente proferida pode detonar o trabalho de uma banda. E vejam bem que isso nos leva a uma outra questão importante, que dá nome ao texto; então não pode dizer que o troço é uma merda? Não pode. E pode. Talvez..."Mas eu achei uma merda!!". Mas isso não se diz do trabalho dos outros, é feio, é mal educado, e quem faz isso deveria ir pro castigo. Pode-se dizer tudo, todos os pontos negativos, oportunidades de melhoria, falhas, use-se o nome que quiser, mas que se tenha cuidado ao dizer isso, e nessa pequena distinção reside uma diferença enorme.
O maior problema que surge quando alguma crítica negativa aparece é o velho argumento de que "precisa respeitar, é o trabalho do cara, deu suor para fazer isso". Mas se o suor do cara só conseguiu produzir um material de terceira qualidade, duro de ouvir, ruim de agüentar, como você vai dizer que está bom e que ele está de parabéns? Impossível. Até porque se lembrarmos dos ratos de Skinner, ao se elogiar um trabalho meia-boca de alguém, reforça-se esse comportamento; e aí o sujeito não vai ter motivos para procurar melhorar o trabalho dele se já está bom. Vai ficar fazendo porcaria o resto da vida.E também não é porque alguém se esforçou para fazer que isso já garante imunidade á pancadaria. Se fez, suou, batalhou, mas alguém não achou bom, tem todo o direito esse alguém de falar o que pensa. E se o músico se sente atingido pelo comentário de alguém que não gostou, e começa a exigir tratamento diferenciado porque está fazendo arte, aí reside um equívoco. O sujeito quer o tratamento e a avaliação como arte, mas quer o lucro como produto. Uai?
Mas no fim das contas não importa tanto O QUE se diz, mas COMO se diz. Existem milhões de formas de sermos construtivos na hora de se avaliar o trabalho de alguém, e isso faz muita diferença para quem ouve. Uma coisa é se escutar algo que você pode deglutir, digerir e usar para melhorar, outra é tomar uma bolada na testa que somente abala sua auto-estima.Por exemplo, depois que comecei a escrever esses textos e participar dos sites como colunista (ou articulista, ou seja lá o que for o rótulo) já ouvi muita coisa legal e generosa, mas tomei muita pedrada também. Algumas pedradas foram elegantes, inteligentes e me fizeram pensar, rever minhas certezas, mas outras pedradas foram só isso, pedradas.
Me lembro de uma em especial de um guri - que eu não conheço pessoalmente - que se auto-denomina carniceira (ou bagaceira, ou enceradeira, sei lá, algo parecido com isso) que gentilmente me mandou um scrap me chamando de "Velho Nojento" e me mandando fazer algo que prefiro não repetir. É íntimo demais.Velho nojento. O que eu faço com uma informação como essa? Não posso – infelizmente – voltar aos meus vinte anos, tenho trinta e cinco e isso é um fato de realidade. Sobre ser nojento, ele não me ajuda ao não definir, e eu não sei o que poderia melhorar na minha higiene, ou no meu jeito de falar, ou na forma como escovo os dentes... diabos! Eu não sei porque sou nojento. E o enceradeira (ou carniceira ou bobageira ou bagasseira, não lembro) então me condena a sofrer por ser isso tudo e sem possibilidade de mudança. Pense em tamanha crueldade, e eu seguindo minha vida tentando não ser nojento, sem saber se estava conseguindo atingir esse objetivo.
Outro exemplo recente aconteceu na comunidade no orkut da Revista Bizz quando um participante chamou um evento Fora do Eixo (o Grito Rock, de Cuiabá) de "lixo". Se ele dissesse que a organização era falha (coisa que não foi), ou que TODAS as bandas fossem um desastre (o que não eram), essas opiniões – frise-se isso, são opiniões – deveriam ser respeitadas e isso poderia até gerar um debate acalorado, com pancadaria verbal, réplicas, tréplicas e por aí vai. Mas seria um debate baseado numa opinião pessoal, que o opinador tinha todo o direito de emitir. Mas quando ele diz "lixo", ele simplesmente desdenha, agride, ofende, tenta humilhar (coisa que não conseguiu) e parecer superior. Na verdade o ato só o rebaixa. Mas isso foi numa comunidade de orkut que prima pelas agressões, o que parece ser a brincadeira favorita deles, então releve-se.
Agora quando o crítico vai analisar um CD, por exemplo, que realmente envolve muita gente trabalhando, muito tempo de esforço, muita grana, aí é necessário muito cuidado. Claro que um crítico de música recebe muito mais coisa para opinar do que ele gostaria, e muito disso tudo é coisa que ele não gosta de ouvir, e precisa ouvir por obrigação. Isso realmente não facilita a atividade e a análise, convenhamos. Além disso, nem sempre tem tempo suficiente para fazer uma avaliação cuidadosa e balizada, mas precisa atender exigências de pauta e pressões do mercado capitalista (condenado por muitos, mas vivido por todos) da empresa em que trabalha. Dureza!E todo mundo tem seus preconceitos, suas manias, suas idiossincrasias e isso afeta diretamente o texto apresentado. Se eu sou solicitado a ouvir um CD de axé, já vou ouvir com o ouvido torto, por tanta garrafa e dança disso-ou-daquilo que já ouvi e sofri para agüentar. Mas a boa crítica coloca a opinião particular de quem escreve em segundo plano, nas sombras, alimentando o leitor de informações suficientes que o deixem curioso para ouvir o CD ou ver o show, porque essas informações são o que o leitor procura no texto. O comentário do Humberto Finatti, da Dynamite, sobre o show do Rockefellers no Grito de Cuiabá é um bom exemplo (aqui). Ele começa o comentário falando que não gosta do som que os cabeludos fazem, mas reconhece que o show é detonante, que eles são bons demais no que fazem e que alcançam e superam o que se propõe. Ou seja, qualquer um ao ler aquilo vai saber duas coisas: a primeira é que o Finas não gosta de hard rock cafajeste, e a segunda é que o show dos caras é tudo que precisa ser um show de hard rock cafajeste. Se isso não informa o público, nada mais vai informar.
O crítico então tem o papel de ser aquela antena que capta as informações e novidades (cada segundo mais acessíveis em tempos de inFernet) e apresenta com dados técnicos e que orientam ao seu público. Não se trata de ser guru, não se trata de ser dono da verdade, mas se trata de ser parceiro do seu público apresentando e incentivando o que é bom e já tem qualidade, e apontando aquilo que ainda não possui qualidade. Infelizmente vaidade interfere, e de todos os lados envolvidos (resenhistas, músicos, produtores, etc e tals) surgem atitudes babacas que poderiam ser melhor resolvidas com um bate-papo numa mesa de bar.
Respondendo à pergunta do título, poder dizer que é uma merda até pode, mas não precisa. Fala para ajudar, e isso gera muito mais resultado.
Eduardo, O Inimigo do rei

terça-feira, 7 de março de 2006



SANGUE SECO em ação!

FanROck analisa o DEMO!

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SANGUE SECO – Demo
Por Vinicius Lemos

Uma quantidade ímpar de bandas chega ao mercado independente todos os dias e meses. Cada vez mais as bandas estão correndo atrás de sua vida e lançando material para ouvirmos, tanto que nem temos como com uma equipe reduzida como a do FanROck dar vazão a tanto material que chega para a gente. Mesmo assim, sempre estamos atentos as boas novidade do mercado. A banda Sangue Seco é um bom exemplo das novidades que surgem no mercado independente nacional, mais precisamente de Goiânia. O Ep Demo já fora citado por mim mesmo quando da minha escolha dos melhores de 2005 e fora citado como 5 melhor do ano, e não é por menos isso. Punk rock na veia, direto, cru, sem meias palavras, direto ao ponto mesmo. Assim é a melhor forma de descrever esse Ep, que tem vários destaques apesar de poucas músicas. A melhor música é Já que é Assim (Já Já, Nerds), refrão colante, guitarra limpa e agressiva, vocal punk na certa, e engajamento, o que se torna muito importante quando se trata de uma banda punk. Outro destaque fica por conta da Não Religião, outro petardo no ouvido digno de ser ouvido em volume alto, máximo, ensurdecedor, para chega mais rápido aos tímpanos, pois é um punk de primeira. Uma banda muito promissora, iniciante, claro, mas promissora, não somente pelo Ep que lançou como também pelo trabalho que o vocalista Eduardo Mesquita está fazendo, organizando a cadeia produtiva do rock num guia. Parabéns para a banda. Seja no engajamento, seja na qualidade do punk feito.